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21/10/2010

Cicatrizes e tatuagens

Depois de muito tempo sem se ver, depois de muito tempo sem se falar eis que o telefone toca com aquele número outrora tão conhecido e agora só um pouco desbotado do passado não tão distante. A mesma voz familiar do outro lado da linha, a mesma risada, o mesmo aperto do peito de quem tentou esquecer a todo custo quem te deu muita coisa pra lembrar. Porém, por baixo do aperto tinha algo...

Não era o mesmo aperto que antes ele sentia, tão pouco era a companheira e costumeira saudade que o tinha atormentado por noites em claro, copos vazios e bocas distintas; era algo novo emburrando pra se colocar onde aparentemente não tinha espaço, algo que ele nem tinha se dado conta de estar carregando. O peso da lembrança de algo bom?

A voz era a mesma, eles eram os mesmos fisicamente, mas por dentro tudo tinha mudado. Já não existia mais amor, nem dor, apenas o carinho pelo que foi, pelo que sempre será enquanto ambos puderem lembrar.

As trivialidades correram soltas. Atualizações de um cotidiano já não visto mais de perto. Novas informações sobre velhos rostos. E quando aquele desligou o telefone, este ficou com a sensação de que havia se perdido por muito tempo, como navio que atravessa mar em noite de tempestade, mas que no final achou seu porto com o sol que, finalmente, brilhava.

O vazio tinha ido embora, as antigas dores também, entendeu que só doeu tanto porque era o primeiro corte na carne imatura; e o primeiro é sempre mais dolorido, mais profundo, porém necessário. O aperto no peito nem era mais aperto e ele pode pela primeira vez ver com olhos aguçados e livres a cicatriz que ficou. Fina, clara, branca, em alto relevo na pele, pra sempre ali - feito tatuagem.